Fico pensando nas questões de não nos aproximar dos nossos alunos, de evitar qualquer tipo de contato e que o distanciamento é primordial. Dias estes, numa sala de 4º ano, percorri por todas as carteiras para acompanhar o desempenho dos alunos em relação à atividade aplicada. No meio do caminho, percebi uma cabeça baixa que estava escondendo a atividade da minha pessoa. Perguntei se estava com dúvidas. Ela me disse bem baixinho: “Tio, não sei ler e não sei escrever”. Eu disse que iria ajudá-la depois que eu olhasse as atividades dos demais. Para minha surpresa, encontrei mais três alunos naquela situação. Como agir? Vou deixá-la sem fazer a atividade?
Sala de aula é contato. É olho no olho. É aproximação. Algumas crianças não se expressam por medo ou vergonha. Eu preciso fazer com que elas se sintam seguras e saibam que estou ali para ajudá-las. Estes alunos de 4° ano perderam as séries mais importantes de suas vidas escolares. Perderam uma boa parte do ensino sobre a escrita e leitura. É uma defasagem que levará tempo para corrigi-la. Não posso, simplesmente, ficar a frente de todos e explicar o que eles não entendem e não compreendem. A atenção individual faz parte do meu trabalho. Eu preciso chegar às carteiras; preciso tirar as dúvidas. Preciso olhar naqueles pequenos olhos e enxergar o medo e a insegurança.
As crianças estão afônicas. Não conseguem se expressar. Eu percebo certa tristeza naqueles pequenos corações que estão presos em calabouços criados pela família e pela escola. Percebo as feridas geradas por este tempo sombrio. Elas me olham, mas não me enxergam. Eu as olho e tento enxergá-las. Não como alunos, mas como seres humanos que gritam por socorro. Não posso mais permitir que o momento atrapalhe o meu trabalho. A ciência conseguirá reverter a situação, porém não há ciência que faça o mesmo com a educação. Somente o professor consegue mudar a vida deste indivíduo. E se tiver que me aproximar para socorrer uma alma em desespero, eu o farei. Se tiver que pegar na mão de um punho não alfabetizado, eu o farei.
O pior vírus nesta história toda é o descaso com a educação. Não há vacina para isso e nem ciência para solucionar os seus problemas. Está nas mãos do professor. Não permitirei o regresso. Lutarei para o progresso. Não deixarei que os pequenos filhos desta pátria passem os olhos no hino de seu país, nos seus direitos e não entendem o que está escrito. É isso o que querem. Não permitirei! Não há evolução se não existir o contato.