Até há poucos anos, quando precisávamos fazer uma pesquisa, tínhamos de recorrer a uma biblioteca, consultar livros, revistas especializadas ou enciclopédias e, dependendo do caso, recorrer a alguém que dominasse o assunto e se dispusesse a elucidar as nossas dúvidas. Também podíamos assistir a palestras de experts em assuntos de nosso interesse. Se quiséssemos cozinhar um prato gostoso, recorríamos a cadernos de receitas, aqueles que passavam de mãe para filha, com algumas páginas com marcas de massa de bolo, ou então comprar livros ou revistas de culinária. Para registrar nossos momentos especiais, viagens, festas, aniversários, recorríamos a máquinas fotográficas com filmes, o que nos limitava a 24, 36 fotos e tínhamos de mandar revelar, sem a certeza de que os cliques tinham ficado bons ou não.
Então surgiu a Internet e o Google, que nos permitem pesquisar sobre qualquer assunto em segundos. Se somos estudantes minimamente interessados em nosso aprendizado, podemos fazer uma coletânea de informações, ler, resumir, comparar e escrever o nosso próprio texto mas, se apenas queremos tirar nota para passar de ano, basta um CTRL+C, CTRL+V e tudo está resolvido, não importa se estamos correndo o risco de copiar e colar bobagens e inverdades ou se teremos um professor atento e interessado o bastante para recusar um trabalho composto em rasa internetês. E, para que perder tempo, nos deslocarmos, para assistir a uma palestra se podemos ver as mais variadas onde estivermos, pelo celular?
Os cadernos de receita de nossas mães, tias e avós, se não foram para o lixo, estão esquecidos num fundo de armário qualquer, pois basta digitar no Google a comida que queremos fazer e vem tudo prontinho, até com vídeo mostrando o passo a passo. E esse é um universo sem limites, podemos procurar por tudo o que seja imaginável que vamos encontrar lá. E, se não gostamos, basta deletar e continuar a pesquisa.
Vieram também os celulares e os smartphones com sua tecnologia avançadíssima que nos levam a um infinito de possibilidades e, no quesito fotografia, nos permite clicar milhões de vezes e ver o resultado na hora, apagando e fotografando de novo se não ficou bom, o que nos leva a fotografar um sem número de coisas insignificantes, eternizando a sua desimportância. Antes, quando viajávamos, festejávamos, ou assistíamos a um show, tirávamos fotos na medida da quantidade de filmes de que dispúnhamos e dificilmente nos preocupávamos em usar mais de dois ou três filmes, até mesmo pelo custo da revelação, mas, isso nos fazia curtir o momento, usufruir do prazer de estar nos lugares, com as pessoas que estávamos, fotografando apenas para registrar. Hoje, se viajamos, assistimos a um show ou festejamos, temos mais contato com aquilo através das fotos que tiramos do que com o fato em si.
E postamos tudo, absolutamente tudo, embora nem tudo seja verdadeiro, nem tudo retrate a realidade como ela é, mas, postamos o que queremos que as pessoas vejam, e elas veem! Pessoas que nos conhecem e que não nos conhecem, elas veem, curtem e esquecem, automaticamente, assim como nós vemos, curtimos e esquecemos tudo o que chega em nosso aparelhinho.
Tudo isso seria formidável se não estivéssemos deixando de conversar, de interagir, de olhar, de prestar atenção, de ouvir, de estar presentes na vida real. Mas, infelizmente, mergulhamos tanto e tão profundamente neste mundo virtual, que as coisas do mundo real já deixam de nos importar e a única urgência é pegar o celular para ver e responder mensagens, postar e curtir fatos e fotos e tudo o que nos tolha, que nos impeça, que limite nossa disponibilidade para acessar, teclar, postar acaba se tornando odioso.
Ainda faço parte do grupo dos últimos dos moicanos que resistem a esse mergulho sem volta nessa água que não molha e nem mata a sede, talvez por isso ainda consiga observar e me sentir cada vez mais perplexa e desconcertada no meio de pessoas que não conseguem olhar em outra direção além do pequeno aparelhinho em suas mãos. Meu Deus, que poder é esse e aonde ele vai nos levar?