Há algumas expressões que nos causam estranheza e até nos fazem rir ao tentar desentranhar a sua origem e significado. Dar nó em pingo d’água é uma delas. Mas, se pensarmos bem, embora pareça absurda, ela não é de todo improvável. Essa expressão se refere a fazer o máximo, beirar as raias do impossível para conseguir alguma coisa ou sair de uma situação embaraçosa com maestria, se virar, ter habilidade e criatividade para resolver as questões mais difíceis.
Dia desses, lavando uma parte do quintal onde ficam alguns de meus cachorros, ao ficar abruptamente sem água devido a um nó na mangueira, me peguei pensando, em tom de brincadeira, embora com sentido totalmente diferente: “Taí!! Isso é, de fato, um nó em pingo d’água! ”. Como era bem cedo e, de manhã, meu cérebro funciona a mil por hora, aproveitei esse fugaz incidente do fluxo de água interrompido para traçar um paralelo com os fluxos interrompidos em nossas vidas.
Um nó ou dobradura numa mangueira faz com que o fluxo de água diminua ou até se estanque e, se demoramos muito para resolver a obstrução, a força da água acaba fazendo com que a mangueira escape da torneira, porque a água não é exatamente uma coisa “gentil” e faz de tudo para continuar correndo, não para simplesmente porque o canal condutor está obstruído ou se interrompe.
Assim também acontece em nossas vidas com as coisas que deveriam ter um fluxo contínuo, mas acabam interrompidas pelas mais diferentes razões, não raro, razões corriqueiras e bobas e o resultado não difere muito do da mangueira enozada ou dobrada, ou seja, a força do fluxo paralisado vai provocar uma explosão em algum lugar, jorrando onde não devia, o que pode nos frustrar, nos deprimir e nos adoecer.
Assim como a água não para a fim de esperar que desfaçamos o nó da mangueira para voltar a correr, nossas energias também irão procurar uma canal para se esvair quando tiverem o seu fluxo interrompido por uma razão qualquer. Isso às vezes acontece de forma concreta, como o sangue impedido de fluir de forma natural na veia entupida pela gordura, no processo conhecido como aterosclerose, que pode desembocar num acidente vascular cerebral (AVC) e outras doenças degenerativas, que provocam a morte ou deixam sequelas.
Menos palpável, porém não menos importante, uma vez que pode causar sérios danos à saúde e provocar a morte, é a interrupção do fluxo normal da vida por pensamentos negativos, inveja, preguiça, ciúmes, ira, contendas, mágoas e ressentimentos. Todas essas emoções, perigosas levam à interrupção do fluxo normal da nossa existência. É um nó que vai represando aquilo que deveria fluir com naturalidade e acaba levando a descompensações e explosões em outras áreas, afetando partes significativas da nossa vida ou a vida como um todo.
Quando aquilo que deveria correr livre encontra um obstáculo que interrompa a sua vasão normal, como a água na mangueira enozada, vai procurar outra forma de caminhar, de sair, de liberar-se e essas formas podem nos causar muitos problemas físicos, emocionais e mentais e nos levar a explosões erradas, em momentos errados e com as pessoas erradas, fazendo de nós verdadeiros nós que vão afetar o fluxo normal da vida em família, no trabalho ou na sociedade, levando aqueles que convivem conosco a se tornarem malabaristas e aprenderem a, literalmente, dar nó em pingo d’água para suportar o convívio com pessoas difíceis e mal resolvidas, com as emoções represadas pelos canais e enozados, dobrados, entupidos. Assim, para o nosso bem e para o bem dos que nos circundam, nos amam e nos suportam, quando percebemos que a água da vida está diminuindo, deveríamos tratar logo de descobrir onde está o nó, a obstrução e resolver a situação para que a água volte a correr, suave e cristalina, como deve ser, até o dia em que o dono do reservatório decidir estancar a fonte e nos reconduzir para o grande manancial de onde partimos e para onde, inevitavelmente, vamos retornar.
