Mulheres de Meia

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A Máquina do Tempo

 

 

Fiquei muito feliz quando a Denise me falou sobre a edição comemorativa dos 50 anos do jornal. Lembrei-me que eu e o Imparcial nascemos praticamente juntos, em 1965. Levamos cerca de 18 anos para nos encontrarmos e caminhamos juntos por vários anos. Nossa identidade tornou-se tão grande que, de simples cronista, passei a repórter, redatora, revisora, agente de publicidade, diagramadora, editora e, quando dei por mim, tinha perdido meu sobrenome e me tornado apenas a “Izilda do Imparcial”.
Um dia precisei ir embora para alçar outros voos e deixei jornal/trabalho/casa/família/identidade para trás. Mais tarde, bem mais tarde, nos reencontramos e pude reconquistar um pouquinho do meu velho amor numa coluna quinzenal. Mudei. Mudou. Mudamos. Hoje ele tem novo endereço, nova cara, novos donos; já não é composto na linotipo, em páginas de 35 quilos de chumbo, e nem rodado nas oficinas da Comtol. Eu também já mudei minha face, meus traços, meus sonhos, minhas crenças, meu endereço, mas, ainda nos pertencemos de alguma forma, imparcialmente.
Pensei em vários temas para o artigo da edição comemorativa, fotografei a velha Olivetti M40, de ferro fundido e teclas revestidas de vidro, primeira máquina usada pelos Tiezerini para compor os primeiros artigos do jornal, legado que coube a mim como preciosa herança quando fui embora. Uma preciosidade, tesouro sem preço dentro dos meus bens. 
Pensei em contar da época que não era publicada uma linha de anúncio que não passasse pelas minhas mãos. Uma vez tive pneumonia. Com 39,5 º de febre fui fazer uma consulta e fiquei internada. Era dia de fechamento do jornal e ainda tinha várias matérias a serem concluídas ou revisadas. O Canarinho levou o material para mim na Santa Casa. Escrevi com o soro no braço, o esforço fez com que o sangue refluísse, entupindo a agulha, me fazendo perder a veia e tomar uma baita bronca da enfermeira. Ou quando eu estava amamentando e a minha mãe levava meu filho para ser alimentado entre uma reportagem e outra, nos mais diferentes lugares. Muitas lembranças, enfim.
Porém, eu fiz uma viagem no tempo que me impediu de concluir o artigo. No dia 16 de janeiro tive um reencontro virtual com um grande amor do passado, a quem um dia abandonei às vésperas do altar, cuja lembrança carreguei comigo e de quem passei 32 anos sem ter qualquer notícia. Esse reencontro bagunçou a minha vida de tal forma que me fez perder o senso do presente. Fiquei um tanto fora de mim, me esforçando para manter os pés no agora, enquanto a minha cabeça, a minha alma e o meu coração retornavam às alamedas do passado, às ruas de Monte Alto, Matão e Taquaritinga, cenário da minha felicidade perdida. Foram três semanas de delírios de amor renascido, fresco e puro, como se tivesse se passado apenas um breve dia entre o adeus e o hoje. Um dia que durou 32 anos, mas que parecia tão curto como qualquer outro. 
Foram três semanas dormindo entre duas e três horas por noite, sem apetite, cinco kg de peso evaporados, esperanças revividas, sonhos ressonhados, a vida inteira ressignificada. Mas, de repente me dei conta de que estava contemplando o meu futuro através de um retrovisor. O tempo passou, os fatos mudaram, outras pessoas entraram em cena e hoje já não há espaço em nossas vidas para esse amor da juventude. Foram três semanas de êxtase, risos, lágrimas, telefonemas, mensagens, ternuras e carícias na alma. Três semanas de um turbilhão que acabou numa despedida madura, sofrida, porém necessária para se poder continuar tocando a vida.
Porém, nesse revertério todo, quando voltei da minha viagem no tempo, retornei com um dia de atraso. Não sei o que aconteceu, não sei que dia eu pulei, apenas sei que todos os compromissos da minha agenda do dia de hoje, 12 de fevereiro, estavam marcados na quarta-feira, inclusive, destacado em vermelho: “Terminar o artigo para a edição de aniversário do jornal”. Fui a São Paulo para resolver algumas coisas, celular fora de área, quando abri meu e-mail, por volta das 18h00, várias mensagens da Denise que me procurava desde cedo, cobrando o artigo e, numa delas, informando que teria de fechar a edição sem ele. Por que vão fechar o jornal um dia antes esta semana? pensei. Que pena, perderei a oportunidade de estar presente na edição de 50 anos! 
Quando entrei no elevador para sair do prédio, só por desencargo de consciência, perguntei à ascensorista: “Que dia é hoje?”. “Dia 12.”, ela respondeu. “Não, que dia da semana?” Ela me olhou de soslaio, meio desconfiada, e respondeu, com voz de óbvio: “Quinta-feira!” Só então eu entendi o desespero da Denise, era quinta, mas eu ainda estava na quarta! Nessa máquina do tempo que me transportou para outra época, eu perdi um dia, me desloquei de tal forma no passado que desestruturei o meu presente. Enfim, a edição de aniversário sairá (saiu!) sem o meu artigo e o que sobrou inteiro de mim precisa se reorganizar para não perder nada além desse dia que se consumiu na memória do tempo e deve ter adormecido nos delicados braços da saudade, para não voltar nunca mais. Parabéns, meu velho e querido amigo, um feliz aniversário de 50 anos e uns dias mais!

 

 

Izilda Alves de Oliveira, nascida em Monte Alto, é formada em Letras pela USP, mora em Atibaia e trabalha no setor de habitação da Caixa Econômica Federal, em São Paulo. É escritora e assina seus livros como Isa Oliveira. E-mail: izilda.oliveira@usp.br

 

 

 

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