Margens e Rios

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“Se diz violento o rio que tudo arrasta, mas ninguém diz violentas as margens que o oprimem” (Bertholt Brecht)

Desde bem cedo, eu me recusei a usar camisetas com frases em inglês, hábito que conservo até hoje. Minha atitude foi fruto de um misto de rebeldia contra o imperialismo americano, numa época em que o Brasil devia até as cuecas aos Estados Unidos e do meu imenso amor pela língua portuguesa. Não que os dizeres em inglês não pudessem ser belos, mas pela falta de sentido em andar por aí exibindo no peito uma mensagem que eu mesma não entendia e a maioria das pessoas que lessem também não saberiam traduzir. Então, comecei a sair à caça de camisetas com frases em nossa língua pátria, ainda que traduzidas de outros idiomas. E uma das que eu mais gostava exibia a frase com que abro o meu texto hoje, do poeta e dramaturgo alemão Eugen Bertholt Friedrich Brecht.
Com o tempo, porém, a camiseta já envelhecida, comecei questionar a afirmação de Brecht, pois não tinha muita certeza se as margens, de fato, oprimiam o rio ou apenas traçavam seu contorno e imprimiam uma direção à impetuosidade de suas águas. Brecht foi um pensador revolucionário e seus escritos fizeram muito sentido dentro de um contexto político de opressão e inspiraram muitos outros revolucionários contemporâneos e posteriores a ele. No entanto, depois de passar cinco anos dentro de uma universidade, aprendendo a esquadrinhar textos, dissecar palavras e fazer verdadeiras intervenções cirúrgicas em frases, esmiuçando seu sentido semântico e etimológico e tentando depreender a subjetividade contida em cada pensamento, meu senso crítico ficou mais apurado E, conquanto continue amando a poesia pela poesia e não pela arquitetura ou estética de sua construção, avaliar o sentido das frases e das afirmações nelas contidas tornou-se uma lei para mim.
“Credo, que texto chato! – devem estar pensando meus leitores – Aonde essa Isa quer chegar?”. Bem, antes de chegar aonde pretendo, ainda vou citar mais um fato, o tema da redação quando prestei a Fuvest, em 2005. Considerado, na época, um dos mais difíceis dos últimos vestibulares, o tema versava sobre a descatracalização da vida, com a imagem de um estranho monumento, no Largo do Arouche, em São Paulo: um pedestal de concreto com uma catraca de ônibus fixada em cima e um alguns fragmentos de texto explicando a obra. Discordar da afirmação em minha argumentação me rendeu passar pela catraca do vestibular e entrar na USP.
Mas, por que tudo isso? O que tem a ver o texto de Brecht com a catraca do Largo do Arouche e o vestibular? Tem que, mesmo tendo sido moldada por uma ideologia revolucionária, a vida me ensinou que discordar por discordar é uma tolice e que não há coisa mais chata do que gente que é “a favor de tudo o que é contra e contra tudo o que é a favor”, atitude que denota imaturidade e uma rebeldia sem causa que não leva a nada. Aprendi a valorizar a importância fundamental das margens do rio, sem as quais não haveria rio, apenas água dispersa que não segue para lugar algum, e também as catracas, os muros, as portas fechadas, enfim, as contenções necessárias, os limites que imprimem à vida um sentido, uma direção. Superar limites é o que nos dá vitórias e significação. É claro que as coisas não precisam ser difíceis o tempo todo, mas, a inexistência de limites gera fracos, frouxos e fracassados. Precisamos ser, ora rios, contidos por margens e ora margens, contendo alguns rios.
Embora se proclamem livres, os que vivem sem limites são, na verdade, prisioneiros e, acreditando erroneamente que podem tudo, que possuem tudo, não constroem nada, não conquistam nada e, como rios sem margens, não saem do lugar, não caminham rumo ao oceano. Rio sem margem é como criança mimada, jovem mal educado, adulto irresponsável e velho desanimado, que põe em tudo e em todos a culpa por suas rugas e seus fracassos. Não se importam em machucar e ferir as pessoas importantes de seu convívio, aqueles que foram colocados em seu caminho para conduzir, proteger e, em momentos cruciais, indicar a direção, exercer o amoroso papel de margem para a impetuosidade das águas do rios de sua vidas.
É, Bertholt, a sua frase é linda, mas, embora ainda possa usar uma camiseta com um poema seu, traduzido para a minha língua, hoje possuo maturidade e liberdade suficientes para discordar de você sem deixar de admirá-lo: não são violentas as margens, porque elas são feitas do mesmo amor que fez as águas impetuosas e o amor jamais será capaz de oprimir o rio. Não é esse o seu papel e nem todo controle significa opressão, afinal, entre o 8 e o 80, existem 72 possibilidades, entre o celeste e o índigo, existem infinitas tonalidades de azul.

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