Na semana passada o Senado aprovou a Medida Provisória que, entre outras coisas, eliminou as taxas sobre bagagens de até 23 kg nas viagens aéreas, algo que muita gente comemorou. Estou fora de casa, em viagem de férias, e o assunto bagagem me inspirou a escrever. Retornarei na próxima segunda e, com base no que usei até agora, posso dizer, seguramente, que até refazer as malas para a viagem de volta, não terei usado nem 1/3 das roupas que trouxe (incluindo calçados e acessórios). Então me pergunto: por que a gente carrega tanta tralha quando vai viajar?
Ao arrumar a mala, pensei em tudo o que usaria no calor, afinal, apesar de estarmos no outono, estava indo para a praia, logo, bermudas, camisetas, sainhas, vestidinhos e maiôs eram o carro chefe. Mas, exatamente por ser outono, embora, até o momento, quente, pensei também nas roupas que precisaria levar para o caso de fazer frio. Isso já inclui, além das roupas adequadas, mais calçados. Pensei também em opções de roupa para sair à noite e, mesmo que em viagens não se costume ir mais de uma vez ao mesmo lugar, não pensei que poderia ir a restaurantes diferentes usando a mesma roupa. No frigir dos ovos, chegando todos os dias cansada dos passeios, nossos jantares têm se limitado a café com leite, pão e manteiga e bolachinhas ou pizza, entregue direto na pousada. As roupas de passeio, coitadas, vão voltar para a mala intactas e talvez um pouco frustradas pela sensação de inutilidade.
Como um corpo habitado por uma alma feminina, óbvio que não deixaria de levar também acessórios e adereços que deixam uma mulher mais formosa. Que tolice! Nem a aliança de casamento estou usando. De vez em quando um brinquinho e, ontem, arrisquei um colar, que retirei assim que cheguei a Paraty e entrei num barco para passear. Lógico que eu também fiz a mala do meu marido… Se minha estimativa é usar 1/3 de tudo que trouxe, ele, se usar 1/5, terá usado muito. Isso sem contar os livros que trouxe para lermos e que ainda nem abrimos…
A alegria demonstrada por algumas pessoas entrevistadas pelos repórteres da TV a respeito do fim da cobrança pelo despacho de bagagem me faz pensar que o excedente é, basicamente, uma regra que atinge a maior parte dos viajantes. Costumo receber amigos em casa com certa frequência e a história sempre se repete: chegam carregados de malas que abarrotam o quarto de hóspedes e passam os dias usando praticamente as mesmas peças. É só o trabalho de tirar tudo da mala e depois rearranjar, sempre pedindo umas sacolinhas emprestadas porque, não sei se vocês já notaram, mas as roupas parecem engordar durante a viagem e, na volta, não cabe tudo na mala de jeito nenhum!
Não entendo por que viajamos tão pesados se é muito mais gostoso caminhar leve. Nossas viagens deveriam ser um treino para a grande e definitiva viagem, cuja data não sabemos, mas, cuja ocorrência é certa. É comum a gente ouvir a afirmação de que no caixão não cabe bagagem e que não levamos nada desta vida. Discordo disso. Podemos não levar nada de material, mas, malas de roupas, livros e calçados não são a única espécie de bagagem que carregamos em nossas viagens.
Tem muita gente que sai de férias e leva o emprego junto. Telefona várias vezes para acompanhar o andamento de coisas do trabalho ou, se não telefona, não deixa de responder às ligações e mensagens de chefes e colegas pedindo ajuda em tarefas e decisões. Oras, férias são férias! O trabalho deve ficar onde lhe pertence, não pode ser carregado na mala, mas, infelizmente, muitas vezes, é. E, se não é o trabalho, muitos levam na mala de viagem seus problemas, suas dificuldades, suas frustrações. Vão a lugares lindos sem estar lá realmente porque o peso que carregam os impede de ver a beleza que precisa ser vista, os impede de curtir, relaxar, renovar-se.
Essa minha fala pode até parecer irresponsável, afinal, os problemas, os desafios, as mazelas e as dificuldades continuarão lá, à nossa espera, mesmo que tiremos férias disso tudo. O objetivo das viagens, dos passeios, ainda que de um fim de semana apenas, é exatamente o de nos esvaziarmos e refazermos as nossas energias para continuarmos as lutas da jornada. Se a gente não cumpre esse objetivo, as coisas ficam ainda piores, porque vamos somar às dificuldades o peso da culpa por termos deixado nossos problemas sozinhos e desamparados enquanto fomos nos divertir.
Na mala da vida, não podemos carregar coisas materiais, mesmo as que mais amamos, tudo terá que ser deixado aqui. Mas, se não formos cuidadosos e prudentes, sairemos deste mundo carregando tanto peso que, em vez de alçar voo para um mundo novo, vamos afundar na sepultura junto com nossos cadáveres, sem conseguirmos arredar pé do lugar.
Esta viagem está sendo para mim um aprendizado e, na próxima, bastará uma sacola com o biquini, umas calcinhas, umas camisetas, o chinelinho que não saiu do meu pé e a confortável bermuda que usei todos esses dias. Tá, uma prudente blusinha para o caso de fazer frio. Mais que isso, é peso inútil. Na próxima viagem, quero usar 100% do que trouxer, então, preciso reduzir 2/3 da minha bagagem. E, na viagem da vida, quero andar tão leve e partir tão leve que nem mala quero levar.
Agora, envio a matéria para a redação, pois isso não é trabalho, é prazer. Enquanto isso, lá fora, o ócio me aguarda. Até semana que vem!