O que é importante na vida é o que é pequeno, o que cabe em parênteses, a citação entre aspas no meio de um texto longo.
O que é importante não é o todo, mas o detalhe, o quase despercebido, o aparentemente insignificante. É aquele beijo em hora inesperada, a pergunta ingênua e grande de uma criança, para a qual não temos resposta e, muitas vezes, estupidamente inventamos uma, geralmente vazia, falsa e até nociva.
É a comidinha gostosa preparada pela mãe ou pela pessoa amada, com a qual nos fartamos, devorando avidamente e encerrando com um arroto, em vez de um elogio.
Não, o importante não é o todo, não é o conjunto, é o detalhe, é a minúcia, o breve que se perde em meio ao supostamente duradouro. O importante não é a hora, mas o minuto, uma alegria boba, um riso de perder o fôlego com uma piada ou uma estupidez qualquer. É a beleza da flor captada pela retina distraída, é o gracejo de um cachorrinho passeando pela calçada, uma pedrinha que chutamos, uma pequena estrela, à esquerda de uma esquina da Via Láctea, quase à margem, quase a ponto de despencar do céu de tão pequenina e sozinha.
O importante é cada tarefa cumprida, cada desafio superado, mesmo que nos tenha nos custado irritação, suor, lágrimas e quase a desistência, muito mais do que o holerite no fim do mês, com seus números sempre menores do que esperamos, precisamos e achamos que merecemos,
O importante é a pequena dívida paga, mais do que as contas que se acumulam e apagam nosso sorriso, tiram nosso sono e afetam os nossos afetos.
O importante é aquele pequeno período do sono em que sonhamos, mais do que a noite inteira dormida. É o sabor do último pedacinho do bife da marmita feita com a comida de ontem. É a espreguiçada, mais do que o cansaço; o copo de água fresca, maior que a sede, maior que o Rio São Francisco, maior que todos os oceanos.
O importante não é a primeira vez, mas a última, porque todas as primeiras vezes são últimas, por serem únicas.
O que é importante não é o calendário, mas apenas o dia. Não é a vida, seus feitos e a ilusão de permanência. Às vezes vale mais o desfeito e só permanece o que é mais impermanente. Uma música ouvida ao longe, de um cantor desconhecido e que nunca mais voltamos a ouvir na vida.
Não são as fotos, mas a nossa emoção ao tirá-las. Não o conquistado com determinação e garra, mas o fugaz, o gratuito, o inesperado, o fútil.
O importante não é tudo aquilo a que renunciamos em nome de um ideal, mas aquilo a que não pudemos deixar de ceder, um pecado secreto, uma besteira qualquer que falamos ou fizemos e que nos fará corar durante anos, ao nos lembrarmos.
Não são as injúrias que toleramos, os chatos que aturamos, o equilíbrio e compostura que mantivemos, mas aquele sagrado e inolvidável momento em que engolimos o ar, fechamos os olhos e mandamos alguém tomar no meio de uma palavra com duas letras.
Não é a vingança maturada, a planejada desforra, a justiça feita ou obtida com a ajuda de advogados, mas apenas o deixar pra lá.
Não é a sinfonia, mas a musiquinha de criança que assoviamos ou cantarolamos, desafinados, para nossos filhos dormirem, para nosso amor se acalmar ou apenas para nos acalentarmos em momentos difíceis, ou simplesmente por falta do que fazer.
Não é o Balé Bolshoi, mas os passos mal dados, ao som de uma música brega, tendo nos braços uma pessoa querida, ainda que tropeçando e lhe pisando nos pés. Mais que o orgasmo, o olhar ou o toque que incendiou o desejo.
Enfim, o importante não é o infinito, não é o universo, não é a lei da gravidade de Newton, a genética de Mendel, a relatividade de Einsten ou as teorias da criação do universo de Stephen Hawking. O importante é um simples peido, um espirro, um olhar nos olhos, um “eu te amo”. O último suspiro, mais do que a vida toda, se ela foi bem vivida. O mais importante é este breve momento, perdido na eternidade, que passamos aqui, tendo um nome, um endereço, um norte. Depois? Depois será apenas depois.