Guerra na Ucrânia: isso tem a ver com todos nós

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“Disse também Deus a Noé e a seus filhos: ‘Faço esta aliança convosco: ne¬nhuma criatura será destruída pelas águas do dilúvio, e não haverá mais dilúvio para devastar a terra. Eis o sinal da aliança que eu faço convosco e com todos os seres vivos que vos cercam, por todas as gerações futuras. Ponho o meu arco nas nuvens, para que ele seja o sinal da aliança entre mim e a terra. Quando eu tiver coberto o céu de nuvens por cima da terra, o meu arco aparecerá nas nuvens, e me lembrarei da aliança que fiz convosco.’” Gênesis 9, 8-15)

Nos últimos dias, tenho estado muito nervosa, num mito de agitação e tristeza, algo difícil de definir. Como sou do tipo de pessoa que não gosta de vivenciar as coisas sem entendê-las, entre uma atividade e outra, fui procurando as causas desse incômodo. Uma das razões poderia ser estar trabalhando demais, no entanto, sempre fui de trabalhar bastante, logo, isso não era um elemento novo, capaz de justificar esse estado de espírito.

Pensei na falta de dinheiro, nas dívidas, na preocupação com as reformas que a casa precisa, no xixi dos cachorros, mas, nada disso me pareceu a real causa do meu mau humor e irritação por muito pouca coisa e da sensação de aperto no peito, às vezes tão forte que parecia que algo iria arrebentar dentro de mim. E não estou falando subjetivamente apenas, de algo que atinge o campo físico. Até brinquei com o meu marido que, se eu continuar assim, logo ele ficará viúvo.

Porém, na tarde de hoje, de uma maneira muito inesperada, eu encontrei a resposta para todas essas incômodas sensações. Fazendo algumas pesquisas sobre a guerra, me deparei com um videoclipe muito bonito, de crianças cantando o hino da Ucrânia. Algumas horas antes, eu tinha assistido a outros dois vídeos. Um que foi apresentado pelo presidente Volodymyr Zelensky, numa reunião com líderes mundiais, com imagens da Ucrânia antes e depois dos ataques da “operação militar especial” de Putin. E o outro, uma animação com a simulação de uma guerra nuclear entre os Estados Unidos e a Rússia, feito pela Universidade de Princeton, em 2019, mostrando que, em poucas horas seriam feitas 91,5 milhões de vítimas. Isso sem considerar as mortes posteriores, em função da radiação deixada pelos ataques.

Eu já tinha sido impactada por esses dois vídeos, mas, ao ouvir as criancinhas ucranianas cantando, fui tomada por uma emoção muito grande e, nesse exato momento, o meu marido, que estava próximo da janela de nosso estúdio, me chamou para ver o arco-íris. Quando me aproximei e vi aquelas cores tão lindas no céu, num arco que parecia tão próximo que, se quisesse, eu poderia tocar, ficou clara para mim a razão de todo o misto de sensações ruins das últimas semanas.

Nós estamos em guerra e esta guerra, longe de ser apenas um conflito entre a Rússia e a Ucrânia, que nós acompanhamos pela internet ou pela TV, é uma questão que afeta a todos nós. E não estou falando da alta dos preços dos combustíveis e dos alimentos, mas de algo muito mais profundo, a questão humana: cidades sendo bombardeadas, soldados matando e morrendo, pessoas fugindo, uma nação sendo destruída.

Aquelas pessoas, são pessoas como nós. Quantas daquelas mulheres, obrigadas a pegar as suas crianças e uma pequena mala e deixar para trás a casa, a segurança, o conforto, os maridos, os filhos adultos, os sonhos de toda uma vida, quantas delas não estavam, como eu – e tantos de nós –, preocupadas com a falta de dinheiro, as dívidas, as reformas que precisavam ser feitas na casa, o xixi dos cachorros, o cardápio do almoço, as roupas para passar, a louça na pia? Ou até mesmo com a cor do esmalte que usariam no fim de semana para impressionar os seus namorados, já que, segundo o procurador geral da república, Augusto Aras, em seu discurso no Dia Internacional da Mulher, uma das grandes habilidades do sexo feminino é escolher a cor do esmalte.

Quantos jovens, pais, maridos, cheios de planos para suas vidas, suas famílias, seu futuro? Planos simples como um passeio, uma pescaria, uma cerveja ou futebol com os amigos, um projeto na empresa, um trabalho escolar. Quantas pessoas foram dormir tranquilas e despreocupadas na noite de 23 de fevereiro, sem imaginar que acordariam sob um bombardeio?

Finalmente, eu pude chorar e dizer para mim mesma e para Deus o quanto eu estou abalada com tudo isso e não se trata de ter medo da ameaça nuclear, da terceira guerra mundial, que pode ser desencadeada a qualquer momento, mas o medo por pertencer à espécie humana, que, quando acuada ou acuando, é capaz de atrocidades difíceis até de pensar. Eu lamento muito pelos nossos irmãos ucranianos que, embora demonstrem uma coragem fora do comum e lutem de corpo e alma, como diz seu hino, para defender a Ucrânia, estão sofrendo os horrores desta guerra. E lamento também pelos russos, pela terrível marca que está sendo colocada sobre todas as pessoas daquele país, pois, agora, o russo se tornou o inimigo. No entanto, aquelas pessoas não são diferentes de nós e dos ucranianos. São pessoas comuns, que também se alimentam de esperança, mesmo sendo submetidas ao controle ideológico e à desinformação.

Olhei profundamente para o arco-íris, que um cético explica simplesmente como sendo o efeito da refração e da reflexão da luz na umidade do ar, e me lembrei que meus pais costumavam dizer que o mundo nunca mais acabaria em água, mas sim em fogo, e o próprio Livro do Apocalipse diz que cairá fogo do céu. Então me dei conta do quão perto podemos estar disso acontecer e a única coisa que consegui pensar foi: Que Deus tenha piedade de nós!

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