Futilidades à la carte

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Quarta-feira, aproveitando a última semana de férias do meu marido, fomos até Campinas para resolver alguns assuntos e, como de costume, almoçamos em um restaurante perto do centro, um lugar agradável, bonito, com boa comida por um bom preço. Como fica numa região comercial, o lugar é frequentado por pessoas que trabalham por ali e também por alunos do Senac, que fica vizinho ao restaurante. Porém, dessa vez, o cardápio trazia uma novidade: futilidades à la carte servidas na mesa ao lado.
O restaurante funciona em um casarão antigo, sendo composto de pequenas salas, o que faz com que as mesas fiquem próximas umas das outras e, inevitavelmente, as conversas acabam sendo ouvidas, sobretudo quando as pessoas parecem fazer questão de falar alto. Na sala em que nos sentamos, havia algumas mesas ocupadas por pessoas comendo em silêncio ou conversando discretamente, mas, em uma delas se sentavam seis mulheres, aparentando idades entre 30 e 50 anos e elas acabaram se tornando o centro das atenções. Como a maioria delas usava uniformes iguais, deduz-se que eram colegas de trabalho e, à exceção de uma, todas usavam alianças no dedo anular da mão esquerda, ou seja, era um grupo de senhoras casadas.
O começo da conversa delas foi sobre a preferência por homens com barba ou sem barba, passando pelos de bigode e fazendo comparações com os maridos, que não tinham os atributos da preferência delas. Até aí, tudo bem, mas logo começaram a mostrar fotos de homens e mensagens nos respectivos celulares, e daí a conversa partiu para as preferências sexuais de alguns desses homens e algumas começaram a dizer o que gostavam de fazer com eles e com outros, com todos os detalhes e palavras. Se elas de fato fazem o que estavam falando nem vem ao caso, mas, o nível da conversa ficou tão vulgar que até meu marido, sentado de costas para a mesa delas, ficou constrangido. Acho que nem numa roda de homens a conversa descamba tanto.
Não me considero uma puritana, mas confesso que ouvir tamanhas futilidades, de mulheres já à beira da meia-idade, casadas, num restaurante familiar, em plena hora do almoço, me causou bastante estupefação. Me lembrei que um dia desses, numa conversa sobre casamento e traição, eu comentei que as mulheres traem por amor e a minha enteada, que tem 21 anos, me disse que eu sou muito ingênua e riu de mim. Percebi que, na velocidade com que as coisas mudam, eu devo ter perdido algum capítulo da chamada evolução dos costumes (ou, mais apropriadamente, degeneração dos costumes). A vida parece ter ficado muito fútil e as pessoas casam por casar, separam por separar e traem por trair.
Com as mídias sociais, tudo ficou muito volátil, muito fácil e muito falso. Que vida é essa? Que mundo é esse? O que realmente as pessoas procuram? E o que elas têm para oferecer para si mesmas e para os outros? Como podem as famílias sobreviverem a essa avalanche de vulgaridade, de traições, de trocas e busca frenética por prazeres fugazes que não levam a nada e a lugar nenhum? Os valores que ainda sobrevivem na nossa sociedade parecem estar invertidos, quando não, pervertidos. É ruim fazermos julgamentos, mas, ouvindo aquelas mulheres no restaurante, provavelmente mães de jovens, de adolescentes, pensei em que exemplo elas podem dar aos seus filhos e o que elas podem cobrar deles se tudo é permitido, se tudo é válido, se tudo parece legal.
Outra coisa que também me deixa de queixo caído é ver as pessoas fumando maconha em qualquer lugar. Quando estudava na USP, era comum chegar na faculdade às oito da manhã e encontrar rapazes sentados na porta fumando um baseado sob os olhos do vigilante, como se aquilo fosse a coisa mais normal do mundo, porém, sabia que o ambiente universitário tem dessas coisas, mas quando comecei a encontrar pessoas passeando na rua com seus cachorros com um baseado na mão, ou ver o vizinho fumando no quintal, jovens fumando na pracinha do bairro em plena luz do dia, me assustei. Me lembro que, quando eu tinha uns 15 anos, Monte Alto conhecia nominalmente os poucos maconheiros da cidade, e isso era um estigma. Lá pelos meus 18, 20 anos, tive amigos que fumavam um de vez em quando, mas faziam isso muito escondidos, tarde da noite, em lugares sem circulação de pessoas. Hoje, isso é feito abertamente, em qualquer lugar e ser maconheiro é algo quase ultrapassado, pois as drogas são tantas e tão facilmente adquiridas, em cidades grandes ou em cidades pequenas, que já é praticamente uma coisa normal e por aí vai. Se formos falar de tudo o que nos causa estranhamento ou nos escandaliza acabamos sendo rotulados, espezinhados e coisas piores.
Não, essas coisas não são normais! O mundo das drogas e o mundo virtual propicia viagens, prazeres, romances, traições e idílios dos mais diversos, mas, não é esse o mundo que sonhamos. Infelizmente, há uma degenerescência muito grande e as pessoas, em vez de se indignarem e resistirem, parecem se sentir vencidas e apanhadas por esse lodaçal e passam a fazer porque todo mundo faz. É algo como “se não pode vencer seu inimigo, junte-se a ele!”. E muito pouca gente parece querer vencer, querer resistir, querer sobreviver. A questão não é as pessoas perderem a dignidade, a questão é as pessoas parecerem nem saber mais o que é dignidade. Imagino aquelas mulheres que esbanjavam futilidade e vulgaridade em pleno horário do almoço chegando em suas casas de noite, olhando para os filhos, depois deitando-se ao lado de seus maridos, que podem até ter um comportamento similar ao delas, sem se importar com nada além dessa vida besta e vazia.
Me alenta saber que há pessoas que ainda pensam como eu, mas acho que estamos fora da caixinha e tenho medo de pensar aonde é que tudo isso vai nos levar. Ainda bem que acredito em algo melhor, senão, não me restaria nada além de sentar, chorar e lamentar o quanto apequenamos e enlameamos o que de tão grande o cardápio da vida nos oferece. A indignação não pode se calar.

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