Se fosse fazer uma comparação grosseira, diria que nós, seres humanos, somos mais facilmente adestráveis que os cães. Esses, para adquirirem ou modificarem um comportamento, precisam de nossa constância, persistência e um sistema de reforço positivo e reforço negativo que requer uma boa dose de paciência até trazer resultados. Já, o ser humano, se adestra por si só, sobretudo para parecer antenado, socialmente aceito e politicamente correto. Bastou surgir um modismo e lá estamos nós, aderindo e partilhando, sem um mínimo de reflexão.
Por isso, de uns tempos para cá, passou-se a repetir muito a expressão “Estado laico”. Logo, uma Bíblia ou um crucifixo numa repartição pública ou em um comércio se tornou uma prática abusiva e desrespeitosa, porque, afinal, o Estado é laico. Em nome disso, por exemplo, a Justiça barrou, em 2017, a construção de uma estátua de grande porte, em Aparecida, e determinou a retirada de cinco monumentos dedicados à padroeira do Brasil, por ocasião da comemoração dos 300 anos do encontro da imagem de Nossa Senhora no Rio Paraíba do Sul.
A decisão judicial atendeu a uma solicitação feita pela Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos. A justificativa da magistrada: fora empenhada verba pública para promover a fé católica, o que fere a quem? Ao Estado laico! Talvez a excelentíssima juíza e a tal associação só tenham deixado de considerar que no Produto Interno Bruto (PIB) de Aparecida, destaca-se a prestação de serviços, maior fonte de renda e de arrecadação de impostos do município. De acordo com o último censo demográfico do IBGE (2011), Aparecida contava com milhares de leitos para hospedagem, centenas de estabelecimentos especializados em alimentação e lojas de artigos religiosos, artesanais e de confecções e mais de duas mil bancas de comércio ambulante, e o Santuário Nacional de Aparecida empregava, na época, 1.570 pessoas, além dos cerca de 800 voluntários que ajudam na acolhida dos 11 milhões de peregrinos que visitam o local anualmente. Ou seja, boa parte do dinheiro arrecadado com a atividade religiosa vai para o Estado. Laico.
Sabemos também que em Nova York e em outras partes do mundo já houve tentativas de se proibir a colocação de árvores de Natal e outros enfeites que remetam à religiosidade, porque isso fere a quem? Ao Estado laico e as pessoas sem fé! Não falta muito para se tentar proibir que os cristãos rezem e comemorem o nascimento de Jesus neste dia!
A lista poderia ficar cada vez maior. Nós aprendemos, constantemente, com toda a enxurrada de movimentos de defesa de tudo quanto é tipo de coisa, que devemos respeitar os direitos dos outros e a diversidade. E respeitamos. Sobretudo as pessoas cristãs, por serem cristãs, têm, na sua formação moral, o respeito ao próximo. Mas, vamos dar um pequeno stop: o outro lado do respeitar é o ser respeitado. Até quando vamos ficar respeitando tudo o que nos dizem para respeitar e sendo cada vez mais desrespeitados nos direitos mais básicos, como a expressão pública da fé, por exemplo?
Agora, vamos ver um outro aspecto dessa situação. Recentemente, tivemos a festa do Halloween, e nessa época, todo lugar em que se entra, loja, restaurante, hotel, farmácia, pousada, escola, está tudo enfeitado com abóboras fantasmagóricas, bruxas, morcegos, caveiras, demônios e outros símbolos macabros – e isso inclui escolas, que pertencem ao Estado laico.
Está havendo, no mínimo, uma discrepância! Primeiro, vamos ficar com o raso, o aspecto cultural. Desde quando festejar duendes, bruxas e vampiros faz parte da nossa cultura? Segundo, se as pessoas não podem expressar a sua religiosidade para não ferir o Estado laico, porque precisam engolir essa enxurrada de demonização cultural? Cadê os defensores do laicismo nessa hora? Ou são dois pesos e duas medidas?
No fim de semana do Halloween eu passei por um pet shop perto da minha casa e dava até medo de olhar para a decoração! Em que esse tipo de figuras vai contribuir para a venda de ração ou trazer algum benefício para os nossos gatos e cachorros que são levados ao local para banho, tosa e consultas com o veterinário?
No dia seguinte à comemoração do inferno, se dá a celebração de Todos os Santos, mas, vá alguém colocar imagens de anjos e santos em seu estabelecimento comercial ou nas suas redes sociais para ver o que acontece: “Radical, bolsonarista, fanático, de direita, conservador, fundamentalista, não respeita o Estado laico e o direito dos que não creem!”
Um streaming fez uma propaganda de uma noite inteira com filmes de terror para comemorar o dia das bruxas. Por que não deu a mesma opção com filmes sobre a vida dos santos, já que as duas comemorações são seguidas uma da outra?
E nós, como nos autoadestramos para fazer o que vai bem no momento, achamos melhor e menos sofrido não ter senso crítico nem opinião própria, ficarmos “na moita”, “não mexer para não feder”, como diziam os caipiras de antigamente. O que me espanta, caríssimos, é um país majoritariamente cristão baixar a cabeça desse jeito e aceitar tudo o que é enfiado goela abaixo.
Para os laicos, ateus, agnósticos e afins, isso tudo é uma grande bobagem, mas, para os outros, é bom lembrar que uma tempestade é sempre prenunciada por pequenas alterações climáticas, ventos, escurecimento e mudança de comportamento dos animais, até mesmo os domésticos. São avisos que nos permitem ter tempo para nos protegermos, nos abrigarmos, recolhermos a roupa do varal e nos prepararmos para o que está vindo. Às vezes, só uma pancada de chuva, outras, um chuvão com ventania, que arranca árvores, destelha casas e carrega até caminhões na enxurrada. Em alguns casos, pode vir até um tsunami… Mas, tem sempre um anúncio, ignora quem quer.
Por isso, é bom que os não laicos se lembrem de uma fala de seu Mestre: “Se alguém se envergonhar de mim e das minhas palavras nesta geração adúltera e pecadora, o Filho do homem se envergonhará dele quando vier na glória de seu Pai com os santos anjos.” (Mc 8:38)
Bem, como Ele é misericordioso, pode ser que considere quando dissermos: “Mas, Senhor, o Estado era laico…”