Lá de Desaguadero eu segui sentido norte. Nesse dia segui até Ilave, onde cheguei bem cansado e sem grandes emoções na cabeça. No dia seguinte, cheguei a Juliaca, pedalando com mais alegria e tranquilidade, já que a estrada esteve plana e o pedal rendeu bastante. Foram 101km de bons pensamentos e cantorias. De Juliaca, mais 100km até Ayaviri, outra viagem tranquila e alegre. Em Ayaviri eu iria ficar só uma noite. Acordei as 5 da manhã, e simplesmente pensei: “Não vou”. É, deu preguiça, não estava afim e não fui. Depois de 5 dias pedalando sem parar, eu resolvi dar um descanso pras pernas, de um dia. Fiquei o dia inteiro na horizontal, assistindo seriados de comédia e falando no Skype com pessoas queridas.
No dia seguinte eu venci a preguiça e fui. Acordei as 5h, as 7h estava na estrada, e daí até Cusco, alguns acontecimentos fantásticos deram mais emoção a toda essa historia. Nesse dia eu cruzei o passo mais alto da viagem até então,” Abra La Raya”, que está a 4340 m.s.n.m. Uma subida sem-vergonha, junto a um vento contra “fiadamãe”, que atrapalharam, mas não me impediram de chegar tranquilo. Daí pra frente, só alegria, mais de 140km descendo, de 4340m até, mais ou menos, 3400m, que é a altura de Cusco.
Estava descendo com os pensamentos lá nas nuvens, e voltei pra Terra quando olhei pro lado e vi uma família gigante abanando as mãos pra mim. Estavam todos sentadinhos, assim, na grama, ao lado da linha do trem, com uma panela de comida tamanho “creche” ao lado e os pratos de sopa nas mãos, quase que tapando a cara de tanta vontade, vontade que lambuzava o nariz e o queixo.
Com as mãos cheias de terra eles me chamaram para participar do almoço. Virei o guidão pra direita, desci o barranco a milhão e cheguei gritando e derrapando o pneu. Larguei a Princesa no chão e fui abraçá-los, como se já os conhecesse há anos. “Toma meu filho, toma essa sopa. Tá aqui o refrigerante, toma”. Comi agradecendo que nem louco, chorando por dentro e rindo por fora. Pedi inspiração pra fazer aquele povo rir e fui falando um monte de besteira, o que vinha na cabeça eu colocava pra fora, e quase morri de alegria quando percebi que estava conseguindo. Risadas tão simples, tão verdadeiras. Quando eu vivo isso, a única coisa que peço é pra que aquela pureza me atinja, me contagie e me livre de todo o mal.
Acho que fiquei uma hora e pouco ali com eles. O almoço estava acontecendo naquele lugar por que era o primeiro dia da construção da casa de um dos filhos, que acabou de se casar. Uns 7 homens cavavam a terra enquanto as mulheres cozinhavam. Muita alegria e gritaria na obra. Depois que terminei a sopa, fui convidado a apadrinhar a casa, ou seja, coloquei a primeira pedra no alicerce e recebi as bênçãos do futuro proprietário, muito legal. Enquanto digeria a comida, sentei no chão e tentei digerir aquela situação, e quando percebi que ia começar a chorar, me despedi.
Pessoal, interrompo por aqui as emoções dessa semana, deixando um “cadinho” para a próxima.
Fiquem em paz e com o “Big Dad”
Beijo à todos!