Aos treze anos eu atingi a minha estatura que tenho hoje, 1,75m. Muita altura para uma pessoa dessa idade, o que me fazia ser sempre a maior da turma, ser colocada para sentar nas carteiras de trás pelas professoras para não atrapalhar os colegas menores, embora eu nunca tenha gostado de fazer parte da turma do fundo, geralmente mais bagunceira e descomprometida com os estudos e ainda me rendeu vários apelidos pejorativos, que hoje seriam considerados bulling, como vara empinada, vareta de cutucar estrela etc. E, claro, aos dez anos eu já não podia mais brincar de boneca ou outras brincadeiras mais infantis, pois era muito grande e recebia algumas críticas por gostar de “brincadeiras de criança”, como se fosse já uma adulta.
Sem dúvida isso provocou alguns arranhões na minha autoestima, além de uma considerável indignação, pois eu era grande pra brincar, mas criança para fazer coisas de adultos, ainda assim, comecei a trabalhar nessa época, aos dez anos, para aproveitar o tamanhão e ajudar em casa. Embora grandona, era uma criança e, às vezes, dizia ou fazia coisas condizentes com a idade que tinha e ouvia, em casa, uma frase que me magoava mais que os apelidos da escola: “Grandona e bobona!”.
O fato de meus colegas de escola serem todos “baixinhos” foi me levando a adquirir o hábito de me curvar para tentar ficar da altura deles, o que me rendeu um sério problema de coluna e uma deselegante corcundinha que me seguiu vida afora. Como é impossível agradar as pessoas, onde quer que eu passasse sempre tinha um tonto de plantão para me corrigir e dizer que eu tinha de andar reta, endireitar a postura. Isso se prolongou até uns dez anos atrás, quando comentei o fato com um ortopedista, com certo tom de tristeza, explicando para ele que, por mais que me esforçasse, não conseguia melhorar a postura.
Ele foi extremamente compreensivo e humano e me disse que nem que eu quisesse isso seria possível, pois a minha coluna, vertebral, após o estirão do início da adolescência, se conformou naquela posição, desenvolvendo os três defeitos possíveis a uma coluna: lordose, cifose e escoliose, ou seja, uma curva prá frente na altura da cervical, pra dentro na lombar e pro lado esquerdo, numa tentativa de compensar os outros dois desvios. E me deu um excelente conselho: “Quando alguém pedir pra você ficar reta, peça pra pessoa ficar alta ou baixa, ficar de olho azul ou criar cabelo, se for careca. Isso é uma característica sua, nunca vai mudar, os exames estão aqui para comprovar isso!”
Bem, ser meio corcundinha não me incomodava, mas, a dor que esse tipo de problema provoca, me incomodava e muito, tanto que desenvolvi uma hérnia de disco e quem já passou por isso sabe o quanto é dolorido e incapacitante. Aí eu descobri um milagre chamado Pilates, acrescido de outro milagre chamado RPG (Reprogramação Postural Global). Como não tinha nada a perder, mergulhei de cabeça! Acabei descobrindo que eu já não tinha 1,75m, mas, 1,72m, pois três centímetros estavam perdidos nos desvios. Em apenas dois meses de prática constante e disciplinada, minha estatura voltou para 1,75m e a minha flexibilidade aumentou consideravelmente, além da horrível corcundinha ter sumido como por encanto! Agora eu e a Iara, minha fisioterapeuta (que desconfio que é uma fada disfarçada de gente), estamos trabalhando, além do fortalecimento muscular, a correção do desvio lateral que ainda persiste um pouquinho. Mas, confesso, nunca foi tão difícil contar até dez!
Cada exercício é uma luta e uma superação. No Pilates é comum a repetição de dez movimentos, com controle da respiração, que é a primeira coisa que se aprende. Misericórdia! Tem momentos em que a gente chega no cinco e sente vontade de morrer! Exercito-me três vezes por semana, durante uma hora, mas, nunca na minha vida vivi horas mais longas! É como se o tempo parasse! Cada movimento, cada respiração – e toda a dor e tensão que os acompanham – dura uma eternidade! Então, refletindo sobre isso, me permiti uma analogia com outras decisões que precisamos tomar, mudanças que precisamos fazer, rompimentos, acertos de rotas. Quantas coisas protelamos ou deixamos pra lá apenas porque é difícil, porque dói ou porque achamos que não temos estrutura para fazer. E vamos andando por aí mancos, corcundas, insatisfeitos e infelizes, muitas vezes culpando a vida e o mundo por nossas mazelas e dificuldades, sobretudo por aquilo que erroneamente acreditamos que não tem solução e não temos coragem de ousar, de tentar mudar, consertar ou até abandonar, se for o caso.
Eu poderia culpar os colegas lá do passado que me deram alcunhas tão pouco agradáveis ou ter raiva das outras pessoas por serem baixinhas, em vez de admitir que eu é que sou alta e que isso tem o seu charme, o seu glamour e a sua utilidade. Sou única, cada um de nós é único e, por mais besteiras que nos falem, por mais que nos desestimulem, a responsabilidade pelo resultado final é sempre nossa. Conseguir ficar alto sendo baixo, ficar baixo sendo alto ou mudar a cor dos olhos de castanho para azul são coisas que não podemos fazer, como bem explicitou aquele médico, mas nos aceitarmos como somos e lutarmos para melhorar o que pode ser melhorado é um dever e a satisfação é enorme. A alegria da superação é algo inenarrável. Cada vez que atingimos um dez numa contagem que parece impossível, percebemos o quão capazes e especiais nós somos, porque assim Deus nos fez. É muito bom me aceitar alta e descobrir, mesmo contrariando os meus exames, que eu posso ser alta e ereta, desde que tenha suficiente paciência e força de vontade para contar até dez!