Mesmo quando vivemos felizes e realizados, atingindo aquele patamar onde pensamos: “Se eu morresse hoje, morreria feliz, não deixaria assuntos pendentes”, há algumas coisas que nos fazem sentir um aperto no coração.
Quando somos crianças e vamos nos preparando para a vida, começamos a idealizar o que queremos ser quando crescermos. Aí, crescemos e vem a fase das dúvidas e indecisões; vamos avaliando o que é viável e o que é inviável, o que nos é adequado e o que não é, o que nos dá alegria e o que repelimos, porém, chega um momento em que esse turbilhão cessa e tomamos a grande decisão do que queremos ser, escolhendo nosso rumo, nossa profissão.
Podemos até nos arrepender mais tarde, ver que a nossa escolha nos remeteu a algo que não era bem o que pensávamos. Às vezes, conseguimos mudar, às vezes não, então, ou nos adaptamos ou vamos passar o resto da vida amargando frustrações.
Entretanto, há algumas pessoas que nascem para fazer determinadas coisas e, por mais que tentem fazer escolhas diferentes, estão fadadas a recair sempre na sua vocação. Não se trata de escolher, mas de fazer algo que parecia já estar determinado em nosso destino. Alguns chamam isso de dom. Há uma gama imensa de coisas que podemos aprender a fazer e, se nos dedicarmos, faremos eximiamente, alcançando êxito e sucesso profissional, mas, há coisas que não há escola que ensine. Se a pessoa não tiver esse talento, essa marca de nascença, pode até tentar fazer, mas os resultados sempre serão pífios, medíocres.
Eu nasci com essa marca e, por mais que tivesse tentado seguir outros caminhos, até me dando relativamente bem neles, só consigo ser completamente feliz e realizada escrevendo. Escrever é algo que faço “com o pé nas costas”, naturalmente, sem esforço, sem cansaço. Embora tenha escolhido como formação o curso de Letras, isso não acrescentou muito ao meu inato dom. A faculdade de Letras não forma escritores, forma gramáticos, professores, coisa que sou e nunca exerci.
Aos 51 anos, com muitos textos esparsos, tenho apenas dois livros publicados, algo que se deve a uma escolha. Tenho amadurecido e me preparado para o último ato de minha vida, quando nada mais farei além de escrever. Há, em minhas gavetas e guardados, pelo menos uma dúzia de livros prontos, esperando apenas o momento de vir a público, momento que está muito próximo, na contagem regressiva.
Sou muito realizada com o que escrevo e publico e com o que escrevo e ainda está por publicar, mas, nesse assunto, há algo que me dá aquele aperto no coração: o fato de nunca ter feito um lançamento dos meus livros em Monte Alto, onde nasci, cresci, estudei, fui mãe e cujos laços nunca se romperam, apesar de ter escolhido partir 26 anos atrás. É claro que, como humana que sou, gostaria que a Secretaria de Cultura se interessasse, me chamasse e organizasse um lançamento (e não pensem que não tentei despertar esse interesse, tentei sim). No entanto, nunca houve uma recíproca nesse sentido.
Recebo mensagens de leitores desta coluna que se identificam com os meus artigos, mensagens lindas e que compensam qualquer falta de reconhecimento oficial, mas, sinto que até com esses leitores estou em falta, não oferecendo a eles o que tenho de melhor, meus filhos-livros. Pensando sobre isso, concluí que eu mesma sou responsável para que isso aconteça, ou melhor, não aconteça, afinal, ninguém precisa de um convite para entrar na própria casa e, mesmo que hoje more em outro lugar, Monte Alto sempre será a minha casa máter. Assim sendo, resolvi mudar essa situação e acabar de vez com esse aperto porque, com a vida tão bem resolvida, não posso manter esse assunto pendente. Pedi a meu editor que me disponibilizasse uma boa quantidade de exemplares de meus livros e amanhã aporto em Monte Alto levando uma bagagem de palavras.
Com a ajuda de alguns amigos queridos, vou organizar um lançamento para o próximo fim de semana. Rápido demais? Não! Há mais de quinze anos espero por isso. Ainda não definimos local, dia e horário, mas, essas informações serão divulgadas em tempo hábil e espero encontrá-lo lá, meu querido leitor, para que você veja que sou uma pessoa comum, de palavras, carne osso. Alguém que nasceu para escrever e que acreditou de tal forma nisso que aí depositou todos os seus sonhos e todas as suas esperanças. E então, posso esperar por você?