Meio-dia, termino a faina prosaica
da cozinha que tem como cenário
pias, panelas e sabão.
Os ladrilhos do chão brilham na expectativa
da espera. Estão dourados…
Passo um creme nas mãos,
para disfarçar cerro as cortinas.
Tenho um tempo infinito
até às duas horas,
… Porta da minha cozinha,
solzinho temeroso invade.
Temos um encontro marcado.
Deito-me no chão,
e ele me queima delicadamente
a pele.
Meu pensamento voa:
margaridas brancas, azuis e translúcidas
recebem-me numa coreografia perfeita,
entrelaçando-se com ramos verdes.
Nesse mar de cor e perfume
recebo o beijo quente
do meu astro-rei.
Ao longe a voz de Elis
… São dois pra lá, dois pra cá…
Um cordão prateado me prende
ao meu corpo,
nave-mãe…
Entreabro os olhos, céu azul, lavado.
Ser só.
Quem o é?
Olho os galhos da figueira,
dou espreguiçada de gato, e pés no chão.
O sol se foi: os telhados vizinhos o levaram.
Os ladrilhos marrons, não mais dourados.
Amanhã ele virá. O sol!
Sei que nunca me abandonará.
Jamais…