SÍNTESE
Não existe democracia absoluta, se existisse seria anarquismo, porque todos mandariam e como consequência, ninguém mandaria em nada. O sucesso de uma democracia está na diferença de ideias, governamentalmente falando, na posição e na oposição. Uma oposição que critica um governo está criticando a si própria, porque ela faz parte da composição de um governo, cuja eficiência está ligada diretamente à ação opositora. Apenas os mentalmente despolitizados se refém à oposição como contrária, ela é sempre uma referência participativa. Quando alguém exerce o poder com absolutismo pode ser contido com uma oposição radicalista, as duas forças não podem ocupar o mesmo lugar ao mesmo tempo. Antes de se condenar um ditador deve-se avaliar o oposicionismo. Ninguém nasce ditador, porém, as circunstâncias criam uma oposição eficiente, com poder de neutralizá-lo.
CULTURA
Monte Alto poderia ter uma Casa da Cultura com acervo vivo. Os antigos diziam que o cavalo passa apenas uma vez na vida arriado. Nosso cavalo cultural passou, todos os antigos locais possíveis de uma memória audiovisual, não estão mais por aqui. A memória viva está na lembrança individual de raros privilegiados. Não se trata de saudosismo, mas de história fazendo história. Ao se falar de história, se entende, erradamente, de acontecimentos oficiais. Não é isso, a história real é aquela vivida pelo povo, que cada qual a seu modo construiu a cidade, sem placa de inauguração. Gente do povo que não tem nome em ruas, porque apenas fizeram-nas e nelas trafegaram a vida toda. A história de Monte Alto foi feita por pessoas que nasceram documentadas por registros de nascimento em cartório e voltaram ao mesmo cartório para se imortalizaram através de atestados de óbito.
FONTE
Nos anos 30, dois agrônomos paulistanos vieram a Monte Alto acompanhados de um agrimensor para marcar e avaliar algumas terras na região de Ibitirama, que segundo um pessoal da capital, eram terras com jazidas de minerais, possíveis de ser extraídos para uso bélico, ou seja, para fabricar armas. A coisa foi meio sigilosa, apenas um ou dois fazendeiros da região ficaram sabendo. O parecer deles proporcionaria a vinda de geólogos para fechar a questão de vez. Nada aconteceu porque os visitantes gostaram da água jorrada das fontes da serra, coletaram uma amostra e apesar do segredo, deixaram vasilhames no hotel onde estavam hospedados. Foram embora e nunca mais se ouviu falar deles e da água que seria mineral e o metal, urânio. Mais de uma vez o avô de um ibitiramense contou o caso para o neto e este para nós. Mortos, avô e neto, sem testemunhal, o caso virou lenda!
RÉQUIEM
A Terra é um planeta que tem de tudo para a sobrevivência de quem vive nela. Dependendo das circunstâncias, as disponibilidades podem sofrer variações, faltar ou sobrar, colocando em risco a manutenção dos habitantes vivos e até eliminá-los de vez. O que não falta, não muda e é perene, chama-se morte. Ela está presente à disposição em qualquer lugar, a morte não está longe e também não está perto, fica o tempo todo vigilante. Gosta de quem está vivo! A morte não procura mortos. A morte é a maior perfeição do planeta, ela é completa, permite até que seja procurada, caso alguém assim o deseje. Ela gosta mesmo é de suicidas!
TUBÉRCULO
Fomos diretor da Associação Comercial e Industrial de Monte Alto, no final da década de 70. Invariavelmente, na ocasião, a produção rural da cidade sofreu um abalo devido o preço baixo da cebola. Como o comércio é dependente da produtividade agrícola, a crise atingiu a todos da atividade. O cebolicultor (chamado no caipirês de ceboleiro) sem preço não tinha lucro. Foi então que tive a infeliz ideia de reunir alguns na sede da nossa entidade, para ajuda-los a procurar uma solução. Fiz uma sugestão simplória, alegando que naquele ano tínhamos que arcar com as consequência, porém, a lição poderia ser aprendida, caso os produtores, nas safras seguintes, limitassem o plantio da cebola. Fiz pior, sugeri que o plantio deveria se proporcionar à área disponível de cada um. Tudo acabou, sem vaia, porém, com total reprovação. (Alguém no fundo da sala ensaiou um sonoro: Comunista! Comunista! Que ficou em solo, ninguém fez coro).
SALADA
A cebola em Monte Alto é icônica, assim como foi o mamão, por conta disso, é repleta de “causos” e lendas. O termo ceboleiro, por exemplo, que identifica apenas quem compra e vende o produto, sem produzir, tornou-se sinônimo de opulência e até de “garimpeiro”, aquele que fica rico da noite para o dia. Quando a safra de cebola era boa, os preços dos imóveis urbanos aumentavam e os gerentes de banco, com os polpudos depósitos, fechavam a meta anual. Um “ceboleiro”, certa vez, confidenciou-me, que a cebola era lotérica, dava um ano e 10 fracassava, sendo que o prejuízo causado tinha origem física, própria do produto, fazia o produtor chorar.
DESFILE
Não se faz Semana da Pátria como antigamente. Nem pátria. O patriotismo saiu de cena, o protagonismo é da corrupção. Na escola, independência ou morte é uma frase retórica, perdeu o sentido e apagou a importância no registro da história. Na semana da pátria escolar a fitinha verde-amarela presa com alfinete no bolso da blusa do uniforme sumiu da educação e desapareceu do civismo.