Mulheres de Meia

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A força da Tempestade

 

Os acontecimentos que marcam a minha vida são tão intensos que é impossível não narrá-los, o que acaba tornando esta coluna quase autobiográfica, mas, não creio que isso incomode aos meus leitores, uma vez que, através de minhas próprias experiências, meus altos e baixos, vou tocando os corações de outras mulheres (e homens) de meia, de menos de meia, de mais de meia…
Moro em região montanhosa. Minha chácara tem vários platôs, em diferentes níveis. Segunda-feira choveu forte por aqui, o que notei ao retornar do trabalho, por volta de dez da noite, encontrando na estradinha de terra fissuras e buracos que não havia quando passei por ali de manhã, aliás, uma ensolarada e agradável manhã. Mas, se esses buracos novos, somados aos antigos, dificultou um pouco o meu percurso, o pior ainda estava por vir.
Ao chegar em casa, encontrei por terra um muro de arrimo, com ele, além dos tijolos, ferros e alambrados, parte do barranco também tinha cedido. Sobre este barranco está construído o meu lar… Esse tipo de evento é algo que se tornou até comum nas chuvas de verão mais fortes a cada ano; a gente vê nos jornais e na TV o tempo todo, só não achamos que um dia vai acontecer com a gente.
Com a queda do muro, meus cachorros machos, alfas e inimigos mortais, que ficavam separados pelo alambrado, já sem nenhuma barreira entre si, a não ser dois metros de barranco facilmente vencíveis com a terra e o entulho amontoado, estavam se atracando e vivendo um inamistoso momento MMA. E eu tive de ser o juiz dessa luta insana, jogar água, dar pauladas e socos no cachorro maior, meu fiel amigo e guardião Godzila, para separar o combate, que, dado o estado lamentável dos três, já devia estar em seu último round. Os três se feriram muito, um deles está internado, provavelmente com fratura de vértebra e rompimento da bexiga, movendo apenas a cabeça.
Passado esse momento de ter de vencer o obstáculo dos escombros na escuridão, debaixo de chuva e caindo na lama algumas vezes, com meu tamanco de salto alto e minha roupa social, vivenciando o milagre de arrastar um enfurecido cachorro de mais de 50 quilos, comecei a cair em mim e entrei em estado de choque. Só no dia seguinte pude dimensionar o tamanho do estrago e o risco de a casa ter as suas estruturas abaladas e poder até vir a ruir com outra chuva forte. A sensação de impotência, de medo, de desamparo, de fragilidade é avassaladora.
Meus colegas de trabalho, comovidos com a minha situação e sabendo que as minhas finanças estão longe do tempo das vacas gordas, se mobilizaram e estão arrecadando fundos para me ajudar na reconstrução do muro. Porém, há muito mais para reconstruir e talvez a queda deste muro, tão sólido e firme quando o deixei pela manhã, signifique que eu tenha de reconstruir a minha própria liberdade, ousando aceitar o desafio de caminhar sem a proteção dos muitos muros de arrimo que construí ao redor da minha alma ao longo desses cinquenta anos de vida. E isso me assusta ainda mais que a própria queda, na verdade, me apavora. Aprendi a me apoiar em muros, a me refugiar atrás de muros, a depender de muros, mesmo daqueles que me limitam e me aprisionam.
Ainda não sei o que farei e como farei. Ao lado da casa, para manter as condições de segurança, a reconstrução do muro é providência urgentíssima e só não começou hoje porque o pedreiro não foi, mas, na minha vida, não sei se muros devem ser reconstruídos, ainda que a falta deles represente o risco de queda da minha habitação, porque nossa alma sequer deve habitar dentro de qualquer coisa, sejam choupanas, palácios, templos, filosofias, ideologias ou convicções. Talvez seja o tempo de me expor ao vento, ao sol e à chuva e encontrar meu abrigo fora da falsa segurança que sempre me norteou. 
Existe uma grande árvore bem no meio do jardim, ela me parece convidativa, sua sombra é ampla e acolhedora e ela exibe frutos com aparência de saborosos. Eu já conhecia essa árvore, mas, me afastei dela há muitos anos. O nome dessa árvore é Amor e, embora não exista nenhuma placa indicativa, sei que não tardarão a surgir salvadores e zeladores de plantão para me advertir de que aquela pode ser a Árvore da Vida, cujos frutos, desde a criação do mundo, sem que se explique o porquê, nos são absolutamente interditados, proibidos. 
Mas, a árvore está ali e eu estou aqui a olhar para ela. O meu muro caiu. O entulho ainda está amontoado, enfeando o meu quintal. Estou cansada, muito cansada, tenho fome e tenho sede, necessito repousar. A essa altura da vida pode ser muito trabalhoso reconstruir convicções e talvez eu tenha de me conformar a aprender a viver sem elas. A árvore está lá. E eu estou aqui. Tenho fome, tenho sede e estou cansada. Muito cansada. Conseguirei resistir ao divino fruto do Amor que se me oferece, agora que muros já não tenho mais? 

 

Izilda Alves de Oliveira, nascida em Monte Alto, é formada em Letras pela USP, mora em Atibaia e trabalha no setor de habitação da Caixa Econômica Federal, em São Paulo. É escritora e assina seus livros como Isa Oliveira. E-mail: izilda.oliveira@usp.br

 

 

 

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