Há alguns dias fomos surpreendidos com as imagens registradas por uma câmera de segurança de um prédio, mostrando um homem agredindo uma faxineira que lavava a calçada. O caso se deu num bairro nobre de Belo Horizonte.
O rapaz, vestido apenas com bermuda e tênis, passeava com seu cachorro, quando passou em frente ao edifício onde a faxineira lavava a calçada. Tomou a mangueira da mão da mulher e, segundo declarações dela, disse que ia ensiná-la como usar a água, pois a água que ela estava desperdiçando era patrimônio público.
Que ele ficasse incomodado com o fato de a mulher estar lavando a calçada é até compreensível, pois não deixa de ser um desperdício, porém, a sua atitude violenta é injustificável e há muito mais coisas envolvidas no ocorrido. Primeiro, o fato lamentável demonstrado pelo agressor de que, para ele, assim como para muitos, as coisas importam mais que as pessoas e, no caso em questão, o importante era a água e não o ser humano que estava na frente dele. Uma mulher de 50 anos, trabalhando pelo seu sustento.
Segundo, será que, por ser um “mauricinho”, como sua aparência dá a entender, ele não consegue ter a compreensão de que aquela mulher era uma trabalhadora cumprindo ordens? Que ela estava ali dando duro, provavelmente muito antes do defensor das águas desperdiçadas ter acordado e que estava trabalhando enquanto ele fazia a sua caminhada?
A ideologia verde é algo que vem ganhando cada vez mais terreno e tem uma grande importância, afinal, defender a ecologia é fundamental para a manutenção da vida no planeta, mas, este é um campo eivado de equívocos e exageros.
Ser bem educado também faz parte da ecologia e uma pessoa realmente preocupada com a natureza deveria, antes de tudo, ter boa educação, não se dirigir a uma mulher humilde do jeito que ele se dirigiu, raivoso, agressivo, jogando água no rosto dela, nos olhos dela e ainda empurrá-la e continuar ofendendo-a e molhando-a ali no chão. Quem humilha as pessoas desse jeito, quem agride uma mulher desse jeito nem merece viver nesse planeta!
A atitude desse infeliz chegou ao conhecimento público porque foi filmada, mas, não se trata de uma atitude isolada. Há muita gente assim. O sujeito estuda um pouco, conhece algumas teorias, se torna adepto de algumas linhas de pensamento e começa a se julgar superior a tudo e a todos, achando que pode reformar o mundo com sua arrogância e truculência e ainda acredita estar abafando, porque está sendo ecologicamente correto, defendendo a gaia, garantindo a preservação da vida do planeta.
Pelo que se pode ver no vídeo, ele estava passeando com o cachorro solto, o que também não é ecologicamente correto, porque pode colocar pessoas e outros animais em risco. E ele não portava nada nas mãos, mas, não deveria estar com uma sacolinha de plástico para recolher os dejetos do seu cachorro? Ou será que se trata de um cachorro ecologicamente treinado para só fazer as necessidades em casa? Ou talvez ele ache que a merda do cachorro dele deve ficar onde cair para servir como adubo.
No comecinho dos anos 2000, eu trabalhei com um ambientalista totalmente radical, do tipo que não come carne, não usa açúcar, não toma leite e nem deixa os filhos comerem doce, sorvete ou refrigerante e, para garantir que isso nunca acontecesse, impedia as crianças de frequentarem a casa dos amiguinhos ou irem a festas de aniversário.
Estávamos trabalhando juntos num projeto de pesquisa sobre casas ecológicas. A visão desse homem era bastante respeitada e ele chegou a organizar uma grande exposição numa faculdade, com a presença de experts do setor, do Brasil e do exterior. A ideia era fantástica, embora inviável para as diversas realidades do nosso país.
Embora eu admirasse muito o trabalho que ele desenvolvia, algo naquele homem não me caía bem. Numa época em que ainda nem se falava em home office, ele já usava essa modalidade de trabalho e tinha o seu escritório em casa. Várias vezes eu o peguei gritando com a esposa e sendo grosseiro com os filhos. Sem contar que não tinha muito tato para lidar com os membros da equipe. Quando ele percebia que tinha exagerado, justificava que estava tenso por causa do projeto.
Um dia eu cheguei e encontrei a esposa dele chorando. Ela me disse que tinha machucado as costas e me pediu se eu podia ajudá-la a passar um remédio. Quando ela levantou a blusa, me assustei com o tamanho do hematoma. Notei também que as lágrimas dela não eram apenas pela dor física. Então, estando diante de outra mulher, ela desabafou.
Na noite anterior, eles tinham participado de um evento, no qual ele a elogiou publicamente, dizendo que ela era uma companheira excelente, que lhe dava toda sustentação e cuidada exemplarmente dos filhos etc. Mas, chegando em casa, ele se irritou com ela por causa de comida, porque não tinha algo que ele queria comer e quando ela lhe ofereceu outra opção, ele a jogou em cima da pia da cozinha, provocando o ferimento nas costas.
Então ela me disse que ou ele era louco ou a queria deixar louca, porque tinha acabado de elogiá-la para uma plateia e depois a agrediu daquele jeito. Me disse que tinha vontade de ir embora, mas que não tinha para onde ir com quatro crianças pequenas. Ela tinha medo dele, as crianças tinham medo dele e as três pessoas que faziam parte da equipe não conseguiram ficar até o fim do projeto. No entanto, era um homem que queria mudar o mundo, salvar o planeta.
É claro que há muita gente boa que nessa área, gente séria, que atua de forma apropriada, mas também tem muita gente que, por não comer carne e por defender uma meia dúzia de conceitos ambientalistas, se acha superior a todos. Na verdade, o que eles querem é livrar o mundo de pessoas como aquela faxineira pobre, que estava trabalhando dignamente. Querem impor uma ideologia ecologicamente correta e viver no conforto de suas vidas medíocres esperando um mundo melhor para si mesmos, desdenhando de quem não aja ou não pense pela medida deles. Lamentavelmente, enquanto houver gente assim, a vida na Terra estará cada vez mais ameaçada.