Embora passando a vida numa longa luta de ignorância, eles dão o nome de paz a um estado tão infeliz. Com efeito, sacrificando seus filhos, celebrando mistérios ocultos, ou entregando-se a orgias desenfreadas de religiões exóticas, eles já não guardam a honestidade nem na vida nem no casamento, mas um faz desaparecer o outro pelo ardil, ou o ultraja pelo adultério. Tudo está numa confusão completa – sangue, homicídio, furto, fraude, corrupção, deslealdade, revolta, perjúrio, perseguição dos bons, esquecimento dos benefícios, contaminação das almas, perversão dos sexos, instabilidade das uniões, adultérios e impudicícias – porque o culto de inomináveis ídolos é o começo, a causa e o fim de todo o mal. Seus adeptos incitam o prazer até a loucura, ou fazem vaticínios falsos, ou vivem na injustiça, ou, sem escrúpulo, juram falso, porque, confiando em ídolos inanimados, esperam não ser punidos por má-fé.
Hoje fala-se muito em censura e muitos têm verdadeira ojeriza por essa palavra, vendo nela tudo de ruim, extremista, ditatorial e controlador que possa existir. A ligação mais comum que se faz à palavra censura é com o período da ditadura militar, pois, depois que o nosso magnífico Caetano Veloso cantou que “é proibido proibir”, qualquer coisa que se proíba, é sumariamente taxada de abuso de autoridade, fanatismo, fundamentalismo, preconceito e fobias das mais diversas. Entretanto, vamos ser bem claros e lúcidos: quem assim pensa, age e fala contra tudo e contra todos que pensem, ajam e falem diferente de si, também é, na verdade, um grande censor, por mais que odeie, despreze e abomine a palavra censura.
Eu faço pouco uso das mídias sociais, porque já tenho ocupações suficientes para consumir praticamente todo o meu tempo e sei que não daria conta de administrar uma rede social. Mas, releiam o primeiro parágrafo deste artigo e pensem comigo: imaginem esse texto sendo publicado na rede, quantos comentários acusatórios não geraria? Certamente, seu autor seria sumariamente cancelado, perderia muitos seguidores e receberia uma enxurrada de críticas. Vamos, não tenha preguiça, volte lá no primeiro parágrafo e leia-o novamente. Uma das primeiras coisas de que seu autor seria acusado: homofobia, transfobia ou lgbtqfobia, pois ele ousou escrever “perversão dos sexos”.
Em seguida, viria a acusação de intolerância religiosa, pois fala em “orgias desenfreadas de religiões exóticas”. Há também a menção de “falta de honestidade no casamento” e “adultério”, logo, a defesa feminista iria acusar o autor de machista, defensor da família patriarcal, contra a liberdade e independência das mulheres. É usada também a expressão “sacrificando os seus filhos”, o que soa como uma crítica aberta ao aborto, mais uma postura radical, intolerante e fundamentalista!
Ah, a expressão “culto de inomináveis ídolos é o começo, a causa e o fim de todo o mal”, parece ser uma das piores do texto, a que fere a liberdade de escolha, afinal, cada um deve crer no que quiser, como quiser e como lhe convier. Sem dúvida, esse texto seria sumariamente censurado, criticado, bloqueado e talvez houvesse até a solicitação para a sua exclusão do canal em que estivesse ancorado.
Não, o texto não é meu. Eu não o coloquei entre aspas ou em itálico, como é comum nas citações de outros autores, de propósito, para causar um impacto inicial. Pode ser que ele tenha causado tanta repugnância em alguns que nem continuaram lendo, perdendo a chance de chegar até aqui para saber que não são palavras de minha autoria.
De uns tempos para cá, tem me causado muito incômodo essa censura prévia que parece querer atingir até o nosso modo de pensar. Uma vez, fui chamada de ignorante dentro da minha própria casa por dizer a uma pessoa que usava uma camiseta com estampa de caveira que não gosto desse tipo de desenho e qual o significado que vejo por traz dele. Não podemos mais ser contra nada, não podemos ter opinião própria, não podemos nos expressar, que somos imediatamente taxados de extremistas e tudo de ruim que se possa imaginar, como se apenas ser você mesmo ofendesse e causasse um efeito tão devastador a outros que também estão sendo eles mesmos, mas, de uma forma diferente de você e que, pelos seus princípios, pode te ferir sim, pode te causar indignação sim, porque, se os representantes das diversidades e os ultraliberais lutam para conquistar o seu espaço, os conservadores também têm direito ao seu. Precisamos repensar o lugar da intolerância, afinal, quem critica a censura com mais veemência, quase sempre é quem mais a pratica, e de forma bastante agressiva, por sinal.
Poderia encerrar aqui e deixá-los curiosos para saber quem é o autor do texto desse primeiro parágrafo, mas, não o farei. Satisfarei a sua curiosidade, tanto para quem pensou que só pode ser um ultraconservador ignorante como para quem se sentiu identificado com o seu modo firme de se expressar. O seu nome é Salomão e seu pai é o Rei Davi. Quem quiser conferir esse e outros textos tão radicais e tão profundamente atuais quanto ele, podem procurar pelo Livro da Sabedoria, a parte mencionada está no capítulo 14, versículos 22 a 29.
Meus amigos, muitas coisas precisam ser repensadas, antes que comecemos a matar uns aos outros por absoluta falta de aceitação recíproca.